De olho na privacidade! Belgian DPA Finds Broad Tax Information Transfers to IRS Unlawful

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Transparência, Dignidade e Limites: A Decisão Belga Contra a Transferência Massiva de Dados Fiscais aos EUA

Em uma decisão que ressoa além das fronteiras da Bélgica, a Autoridade de Proteção de Dados belga declarou ilícitas as transferências sistemáticas de dados fiscais de cidadãos com dupla nacionalidade — os chamados “americanos acidentais” — à Receita Federal dos Estados Unidos (IRS). Trata-se de uma intervenção não apenas jurídica, mas moral, na tênue fronteira entre acordos internacionais e a proteção da dignidade individual.

O caso gira em torno da aplicação do Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA), legislação norte-americana voltada a combater a evasão fiscal. Mesmo residentes permanentes na Bélgica, que herdaram involuntariamente a cidadania norte-americana, foram compelidos a ter seus dados financeiros transmitidos ao governo dos EUA com base em um acordo bilateral firmado em 2014, anterior ao Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR). Contudo, a Autoridade belga, ao analisar a legitimidade dessas transferências à luz da legislação anterior e posterior ao GDPR, concluiu que tal prática excedia os limites da proporcionalidade e da necessidade.

O ponto nevrálgico da decisão repousa na ausência de salvaguardas adequadas no controle e na transmissão de dados sensíveis. A lógica do FATCA, ao operar indiscriminadamente sobre qualquer titular de cidadania americana, independentemente de sua efetiva ligação com os EUA, confronta o núcleo dos direitos fundamentais europeus: o respeito à vida privada e à autodeterminação informacional. Não se trata apenas de verificar o cumprimento de formalidades normativas, mas de exigir substância em qualquer tratamento de dados transfronteiriço.

A autoridade belga determinou que, em até um ano, o Ministério das Finanças limite drasticamente o volume de informações partilhadas, realize avaliações de impacto e melhore a transparência perante os cidadãos afetados. Essa decisão, embora fundada em contornos técnicos, sugere algo mais profundo: há limites éticos para o exercício da soberania fiscal quando este colide com a dignidade dos indivíduos. O fato de um cidadão possuir determinado passaporte não pode, por si só, justificar a exposição irrestrita de sua esfera íntima.

Esta deliberação belga poderia ser a primeira fissura em uma engrenagem internacional que, sob o pretexto da segurança e do combate à fraude, banaliza o indivíduo em nome de uma lógica de governo algorítmica e extraterritorial. Mais do que uma controvérsia tributária, estamos diante de uma disputa sobre os contornos da cidadania contemporânea. Em tempos de governos datificadores e vigilância transfronteiriça, lembrar que a proteção de dados é também uma luta por espaço público, por limite ao poder e por ética nas relações institucionais torna-se não apenas urgente, mas indispensável.

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